61º Festival de Cannes

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Sábado, 24 de maio de 2008, 14h37 Atualizada às 15h02

Cantet fecha competição em Cannes com ótimo drama escolar

Orlando Margarido
Direto de Cannes

A 61ª edição do Festival de Cannes começa a se esvaziar, com os jornalistas voltando a seus países e a inexistência de estrelas no tapete vermelho. Foi nesse clima de fim de festa que o diretor francês Laurent Cantet apresentou Entre les Murs (Entre os Muros), um drama levado inteiramente dentro de uma escola do subúrbio parisiense, ou para ser mais preciso, quase sempre numa sala de aula onde estudam adolescentes entre 13 e 16 anos.

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É o último filme a ser apresentado na disputa pela Palma de Ouro, cujo vencedor será conhecido amanhã, em cerimônia a partir das 19h15 no horário local.

Embora a platéia não fosse das maiores entre os filmes da competição, a recepção foi calorosa e a opinião correu o Palais du Festival como uma surpresa no último minuto do segundo tempo.

No passado, vencedores como Rosetta, dos irmãos belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne ¿ que voltaram este ano à competição com Le Silence de Lorna ¿ também fecharam a programação.

Tudo é surpreendente no filme de Cantet, baseado num fato real. Trata-se de uma adaptação do livro homônimo escrito por François Bégaudeau, professor que atualmente não exerce a profissão, mas se dedica a escrever sobre suas experiências na sala de aula, além de colaborar para revista e jornais, inclusive na crônica esportiva.

Bégaudeau interpreta a si mesmo neste enfrentamento, pois quase todo o tempo é esse o clima na classe, com alunos indisciplinados e pouco interessados em seu curso de francês. Preferem contrariar todo o tempo o professor e colocá-lo em situações delicadas, no limite da explosão.

O embate final vem quando um estudante de origem africana vai a conselho de classe devido a uma discussão ríspida e uma possível humilhação por parte do professor.

Cantet mantém por mais de duas horas o conflito com grande impacto dramático. É um trabalho de ficção, mas com fonte documental, não apenas devido ao livro que lhe serve de material, mas também porque os alunos são estudantes de verdade cooptados numa seleção voluntária na escola que serve de cenário à fita.

Em entrevista, Cantet contou que a razão de seu interesse pela obra de Bégaudeau está ligada às crianças, na medida em que se surpreendeu com a facilidade com que elas enfrentam e falam no mesmo nível com o professor.

"É perturbadora a idéia de onde pode chegar a relação entre alunos e professores hoje numa escola", disse. "Especialmente se ela estiver nas circunstâncias daquela mostrada no filme, numa periferia, onde há crianças representantes de diversas etnias, e onde há todos os motivos para não se focar os estudos".

Esse desinteresse por parte dos alunos fica patente a todo momento, obrigando o professor a estratégias das mais criativas para ensinar e conquistar a turma.

"Mas claro que não se trata de um método fixo, pré-concebido; eu tinha que improvisar todo o tempo, estar preparado para as colocações mais inesperadas, e claro, tentava não perder o controle", explicou Bégaudeau.

Ele acrescenta que mesmo o roteiro sofreu variações durante as filmagens pela improvisação dos alunos investidos de atores. "A idéia era chegar o máximo possível à naturalidade, então não poderíamos recusar essa participação livre".

Um dos melhores achados da fita é a decisão de em nenhum momento ir para além dos muros do colégio. São os fatos exteriores que chegam até a instituição, na situação dos imigrantes ilegais, a exemplo da mãe deportada de um aluno chinês, ou da professora que anuncia sua gravidez.

Só se sabe da vida dos alunos fora da escola pelos comentários desses mesmos ou quando seus pais vêm até Bégaudeau.

Cantet recusa qualquer aproximação de seu filme com um contexto político ou ideológico. Diz que sua intenção é um retrato do universo escolar em geral. De forma mais específica, impõe-se como um estudo da consciência de um tipo de profissional que se debate entre sua responsabilidade e a pesada carga da instituição e suas leis repressoras e pouco flexíveis.

É a mesma postura adotada por ele em seus trabalhos anteriores, como Recursos Humanos e A Agenda, com a diferença que esses dramas se passam no mundo globalizado do trabalho. São ótimos filmes, mas Entre les Murs os supera na condução e no complexo mundo que visita. Será uma injustiça com ele e seu bravo elenco, que compareceu em peso ao festival, se o júri não contemplar o filme com um prêmio digno de tal esforço.

Especial para Terra

Reuters
Francois Begaudeau divulga filme com o diretor Laurent Cantet
Francois Begaudeau divulga filme com o diretor Laurent Cantet

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