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E se Hitler acordasse hoje? Ditador resparece em filme

8 out 2015 - 07h59
(atualizado em 9/10/2015 às 17h42)
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Na comédia "Ele está de volta", ditador nazista reaparece em plena década de 2010. Filme questiona a relação dos alemães com o nazismo de forma nova, ao mesmo tempo cômica e inteligente.

Er ist wieder da, baseado no romance satírico Ele está de volta, não é a primeira vez que David Wnendt enfrenta o desafio de dirigir a versão cinematográfica de um best-seller de ficção.

Em sua visão radicalmente subjetiva, Zona úmidas, reunindo divagações da autora Charlotte Roche sobre drogas, higiene genital, práticas sexuais com vegetais e outros assuntos íntimos – também parecia, a rigor, impossível de adaptar para a tela.

O cineasta alemão de 38 anos igualmente teve que pesquisar a fundo os círculos neonazistas para seu filme Combat girls. Ele enfoca uma jovem do Leste da Alemanha dominada pelo ódio aos estrangeiros, aos judeus, policiais e todos que considera responsáveis pelo declínio de seu país.

O lançamento desta quinta-feira (08/10) não trata tanto da cena política de extrema direita, mas sim de como as pessoas comuns reagem ao serem confrontadas com a ideologia direitista. Ainda mais quando é Adolf Hitler em pessoa a lhes dar a impressão que alguém as ouve e está do lado delas.

Saudações ao "Führer"

O ponto de partida do longa é o do livro homônimo de Timur Vermes: um belo dia, em plena segunda década do século 21, Adolf Hitler desperta em Berlim, sem qualquer noção do que aconteceu no país e no mundo desde 1945.

Os realizadores de Er ist wieder da foram mais além, atravessando de fato a Alemanha com o ator Oliver Masucci, que encarna o ditador nazista. Por toda parte vivenciaram cenas semelhantes: passantes cumprimentavam entusiásticos o falso Hitler que passava de carro, assumiam postura de soldado e faziam a saudação nazista. Se possível, aproveitavam para tirar uma foto ao lado do "Führer".

Mas o pior não era isso: alguns não conseguiram conter o impulso de abrir seus corações com essa encarnação do fascismo. A dona de um quiosque de salsichas currywurst não perdeu a oportunidade de comentar com "Hitler" a suposta liberdade dada aos estrangeiros para se comportarem mal – segundo a vendedora, tudo fruto do sentimento de culpa que os alemães portam consigo desde a Segunda Guerra Mundial.

"Havia uma ira silenciosa entre a população, que me lembrava 1933. Só que na época o termo 'desilusão com a política' ainda não existia", diz Hitler, a certa altura do filme, em referência ao ano em que os nacional-socialistas assumiram o poder na Alemanha.

Trata-se de um exagero, é claro. Mas, afinal de contas, numa comédia é legítimo usar tais recursos. Problemático é nem todas as cenas que dão a impressão de ser documentais, o serem de fato. Como quando "Hitler" visita a central em Köpenick do Partido Nacional-Democrático da Alemanha (NPD), de extrema direita. Lá, ele não se encontra com funcionários partidários verdadeiros, mas sim com atores – uma sutileza que pode escapar a parte dos espectadores.

Um povo, duas faces

Ainda assim, o filme merece que se perdoe tudo isso. Pois quando se viu tanto humor negro e profundidade política numa produção alemã? O espectador tem vontade de exclamar: "Finalmente ele chegou!"

Não o "Führer", claro, mas sim um filme desses, que questiona a relação dos alemães com Adolf Hitler de forma totalmente nova, ao mesmo tempo cômica e inteligente. Pois não é fácil avaliar a parcela da população que saúda o NPD, aberta ou secretamente; que na mesa do bar concorda que "no tempo de Hitler não era assim tão ruim"; ou que promove arruaças contra os refugiados.

Numa passeata recente do movimento Pegida (sigla em alemão para "Europeus patriotas contra a islamização do Ocidente") na cidade de Dresden, cerca de 9 mil cidadãos se reuniram para protestar contra uma suposta "estrangeirização excessiva" do país.

Isso não é muito, diante de uma população de 80 milhões. A maioria dos alemães, pelo contrário, mostra outro rosto, que dá boas vindas aos refugiados. Porém o que o filme deixa claro – do seu jeito exagerado de comédia – é que, ao que tudo indica, para jovens e velhos, o criminoso nazista Adolf Hitler não está tão presente como advertência permanente quanto os alemães gostariam de acreditar.

Suicídio em questão

Coincidindo com a estreia de Er ist wieder da nas salas alemãs, desponta um debate sobre se Hitler não poderia ter sobrevivido à Segunda Guerra. O catalisador é um documentário de TV dos Estados Unidos, que seguiu rastros supostamente deixados pelo ex-ditador em diversos países depois de 1945.

Consta que, ainda anos após o fim da guerra, o FBI teria perseguido traços da presença de Hitler na Argentina e no Brasil, entre outros. Os documentaristas examinaram centenas de documentos confidenciais do serviço secreto americano, divulgados apenas em 2014. Estes deixam margem à versão de que em 30 de abril de 1945 o líder nazista e sua companheira, Eva Braun, não se encontrariam no abrigo aéreo da Chancelaria do Reich, mas sim teriam desaparecido na clandestinidade.

Além disso, os trabalhos de filmagem teriam confirmado a existência de um túnel garantindo a ligação entre o "bunker do Führer" e o aeroporto Berlim-Tempelhof em 1945. A partir de meados de dezembro, o canal americano History transmite a série em oito partes.

"Eles não conseguem se livrar de mim", diz Hitler perto do fim do filme. "Eu sou parte deles."

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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