Em Veneza, diretor brasileiro diz estar satisfeito com 'Lope'
- Orlando Margarido
- Direto de Veneza
Fim de festival e coube a uma mirrada plateia de jornalistas, formada em sua maioria por brasileiros e espanhóis, conversar nesta tarde de sábado (11), em Veneza, com Andrucha Waddington, único nome do Brasil a apresentar um longa-metragem nesta edição, na seção fora de concurso.
Ainda assim, Lope se trata de uma co-produção com 80% de capital espanhol, incluindo participação da Telefonica, e o restante de investimento verde-e-amarelo. Deste bloco faz parte a Conspiração Filmes, produtora carioca da qual o diretor é sócio. O projeto sobre o poeta e dramaturgo Félix Lope de Vega (1562-1635), nome exponencial do chamado Século de Ouro espanhol, chegou às mãos do cineasta pelo roteirista catalão Jordi Gasull, que assistiu e se encantou com Casa de Areia, filme de Andrucha de 2005.
Uma origem que já enreda um possível debate sobre a razão de um realizador brasileiro assumir tal empenho com um personagem tão relevante para a cultura espanhola, autor de mais de 4 mil obras e considerado um gigante literário por Cervantes. Andrucha já havia comentado com o Terra, antes do início do festival, que não se sentiu pressionado de alguma forma no país de Lope. Voltou a reafirmar a ideia agora e justificou ter aceitado a incumbência.
"Essa é a magia do cinema, poder mergulhar em algo que não se conhece e fazer uma descoberta, o que foi o meu caso com o escritor, pois pouco o conhecia", disse.
O resultado da estreia do filme no dia 1º de setembro na Espanha, com 309 cópias, relativiza o pensamento do diretor em duas frentes. A da bilheteria o apoia, pois Lope foi o segundo melhor resultado de vendas de ingresso em um fim de semana entre filmes espanhóis este ano, atingindo a cifra de 917 mil dólares, segundo dados da revista Variety.
O outro front, da opinião especializada, é menos animador. "Foi uma metade que gostou, 30% que não gostou, e o restante de críticos que me deram uma cacetada na cabeça", calculou o próprio Andrucha, que daqui segue para o Festival de Toronto, no Canadá, onde o filme será mostrado.
"Só tenho a dizer que é um filme feito com o coração e empenho de todos os envolvidos; estou satisfeito com o resultado e não mudaria nada se tivesse que fazer o filme de novo".
Coração que diz também muito do ponto de partida do filme, uma história de amor na visão do cineasta, antes que épica ou de fundo histórico. Lope é uma "prequel" - a "prequência", ou seja, fase que antecede uma história principal - da vida do poeta, antes que ele parta para o exílio e se torne símbolo de um período.
Começa com a sua chegada da guerra e o estabelecimento como novo e ousado autor de comédias graças a uma chance dada por um mestre em atividade, Jerónimo Velásquez (Juan Diego). Enquanto vive as primeiras experiências no palco, enamora-se pela filha de Velásquez (Pilar López de Ayala) e mantém um romance com uma amiga da família (Leonor Watling) e termina prestando serviços poéticos ao Marquês de Navas (Selton Mello).
As atrizes estavam presentes na entrevista, mas o protagonista argentino Alberto Ammann não veio por estar ocupado com uma publicidade para a grife Chanel.
O resultado é um filme correto, com selo garantido de qualidade artística, como se espera de uma produção de grande orçamento, o que inclui representação de época, figurino, fotografia e outros recursos. Dá conta de sua proposta sem ousar ou arriscar e tem o benefício de ser a primeira versão ambiciosa para cinema da vida de Lope. Perguntado se tratar de seu nome na Espanha poderia ser um tabu no cinema, o roteirista disse não saber por que até hoje não houve uma adaptação notória para as telas.
Por isso também Andrucha acredita estar mostrando aos próprios espanhóis um pouco da trajetória de seu herói, em um período juvenil, que eles mesmos desconhecem. Já os brasileiros poderão conhecer o Lope de Andrucha a partir do dia 7 de outubro, no Festival do Rio, ou a partir de 26 de novembro, quando o filme entra em cartaz nas salas comerciais.
