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"Foxcatcher" é um retrato sombrio do fracasso do sonho americano

21 jan 2015 - 16h44
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Mark Schultz (Channing Tatum) é praticante de luta greco-romana e ganhador de medalha de ouro nos jogos de 1984. Nada disso, no entanto, torna sua vida e carreira mais fáceis.

Atores Chaning Tatum (esquerda) e Steve Carrell posam para foto com o prêmio conquistado com o filme "Foxcatcher" durante o Hollywood Film Awards, em Hollywood. 14/11/2014
Atores Chaning Tatum (esquerda) e Steve Carrell posam para foto com o prêmio conquistado com o filme "Foxcatcher" durante o Hollywood Film Awards, em Hollywood. 14/11/2014
Foto: Danny Moloshok / Reuters

Os louros da vitória não garantem patrocínio, nem um salário para sustentar sua família. Sua fonte de renda consiste de palestras motivacionais para adolescentes em escolas, e o cheque não é muito gordo. Por isso, quando o multimilionário John du Pont (Steve Carell) se aproxima dele, a sorte parece ter mudado.

Essa mudança é, entretanto, dúbia. Um clima sombrio paira o tempo todo sobre “Foxcatcher: uma história que chocou o mundo” – drama que retrata a relação tumultuada e trágica entre du Pont (herdeiro da famosa família) e os irmãos Mark e David Schultz (Mark Ruffalo).

O filme rendeu a Bennett Miller (“Capote”) o prêmio de direção no Festival de Cannes do ano passado, além de uma indicação ao Oscar a ele (diretor), Carell (ator), Ruffalo (coadjuvante), roteiro e maquiagem.

O personagem de Carell, aliás, é uma figura peculiar. Herdeiro de uma das famílias mais ricas dos Estados Unidos, vivendo sob o domínio da mãe (Vanessa Redgrave) com um complexo de Édipo mal resolvido, ele quer ser o melhor em tudo.

Taciturno, mas rico, com seu dinheiro e conversa acaba ganhando a confiança do lutador, que abandona os treinos ao lado do irmão, e se muda para a propriedade da família du Pont.

John começa a canalizar suas aspirações e anseios no jovem lutador, que, claramente, sente o peso da pressão. Aos poucos, as relações vão se degringolando. O roteiro de E. Max Frye e Dan Futterman é um estudo de personagem sombrio, centrado na ideia de que o propalado sonho americano é uma grande mentira. Não por acaso, a bandeira do país aparece tantas vezes em cena – em algumas delas, pendurada no escritório de John.

Tanto Tatum quanto Carell estão bem distantes dos registros que os tornaram famosos. O lutador não tem nada de heroico, pelo contrário, é um sujeito decadente que se esforça para sobreviver num mundo que o engolirá. Mark é o retrato do jovem americano comum, de bom coração, cheio de sonhos, e, em sua ingenuidade, acredita que será ajudado sem dar quase nada em troca.

Já Carell, bem distante da comédia e com o rosto coberto por uma maquiagem e uma prótese nasal, cria uma figura trágica e assustadora. É o outro lado da relação: aquele que empresta e cobra com juros altos. É também o lado obscuro do sonho americano, que se apoia na total submissão de quem o abraça.

Em seu terceiro longa, Miller (que também dirigiu o irregular “O homem que mudou o jogo”) mostra total segurança na condução da narrativa, na criação da atmosfera que se resume a uma descida ao inferno. Desde a entrada de du Pont em cena, percebe-se para onde caminha a disputa entre aquelas pessoas. Ainda assim, o diretor é capaz de manter a tensão.

Apesar de situar a ação em algumas décadas no passado “Foxcatcher” é o retrato das relações de classe nos EUA do presente, em suas ingenuidades – como Mark – e contradições – como du Pont. É um filme que ressoa na era do individualismo e da competitividade, na dominação da elite, que espera que todos estejam ao seu dispor – e cobra muito caro quando isso não acontece.

(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb

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