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Cinema

 
 

Crianças brilham em filme japonês em Cannes

15 de maio de 2004 15h01

A história verídica de quatro crianças abandonadas pela mãe para sobreviver sozinhas chocou o Japão, mas levou o diretor Hirokazu Kore-eda a pensar nas pessoas ocultas por trás das manchetes.

O resultado é o filme Nobody Knows (Ninguém Sabe), uma visão poética e enxuta da infância que levou críticos endurecidos a fazer força para segurar as lágrimas no Festival de Cinema de Cannes.

O filme é um dos 19 que concorrem à Palma de Ouro, após o acréscimo de última hora do documentário Mondovino ao grupo dos participantes da competição oficial.

Usando atores amadores e filmando sobretudo dentro de um pequeno apartamento de Tóquio, o ex-documentarista acompanha o mergulho das crianças no abandono, mas também celebra momentos de alegria.

"É, de fato, uma história chocante, mas eu não quis adotar uma abordagem jornalística ao assunto", disse Kore-eda em coletiva de imprensa, na qual alguns dos membros mais jovens do elenco se esforçavam para olhar por cima dos microfones.

"Em lugar disso, eu quis mostrar essas crianças por dentro, expor o que elas passaram, a energia que tinham para sobreviver, seus sentimentos, a proximidade entre elas", acrescentou.

Os quatro irmãos eram filhos de pais diferentes e nunca tinham ido à escola. O senhorio e os vizinhos não sabiam da existência de três deles, que nunca tinham saído do apartamento.

Um dia sua mãe desaparece, deixando dinheiro e uma carta pedindo ao filho mais velho, Akira, que cuide dos irmãos. Após uma breve visita, ela sai da vida deles para sempre.

Num primeiro momento, as crianças não compreendem que a perderam para sempre e se esforçam para continuar como antes.

À medida que o dinheiro vai acabando, sua vida vai pouco a pouco desabando. A água e a eletricidade são cortadas, e eles são obrigados a procurar comida no lixo.

Em cenas filmadas cronologicamente ao longo de um ano, o elenco, que tem entre 6 e 14 anos, brilha em atuações comoventes.

Yuya Yagira, que faz o papel de Akira, é o ponto principal da história, que incorpora detalhes da vida real tais como o momento em que sua voz muda.

Para manter os diálogos dinâmicos, Kore-eda não deu roteiro aos atores e fez o mínimo possível de ensaios.

"Nem as crianças nem eu temos certeza sobre o que é real e o que é fictício neste filme, se cada pessoa está fazendo seu próprio papel ou retratando um personagem", disse ele.

Em uma cena chave, as crianças comemoram a primavera, saindo de casa pela primeira vez em meses. Mas, em pouco tempo, sua alegria é seguida por uma tragédia que parece ser inevitável.

Durante o filme todo, os adultos que os cercam parecem ser incapazes ou não se dispor a reagir a seus sinais evidentes de problemas. Mas Kore-eda evita fazer julgamentos, mesmo da mãe.

"Eu quis fazer o papel da mãe muito humano. Pensei que, se ao final do filme, as pessoas saíssem colocando a culpa na mãe e dizendo que ela era atroz, eu teria fracassado", disse o diretor.

Reuters
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