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Cinema

 
 

Fernando Bonassi fala do desafio de Carandiru

10 de abril de 2003 17h44

O escritor Fernando Bonassi passou mais de um ano ao lado do cineasta Hector Babenco e do roteirista Victor Navas, dissecando um best-seller de quase 300 páginas para o roteiro de Carandiru.

Apesar de ainda não ter visto o filme pronto e de ter deixado a produção antes da finalização do roteiro por causa de uma "relação conflituosa com Babenco", Bonassi sabe do grande desafio que Carandiru tem pela frente, a partir de sexta-feira, quando entrar em cartaz.

"O livro foi muito lido, muitos exemplares passaram de mão em mão, o que gera uma grande expectativa (quanto ao filme). O que eu me pergunto é se o filme vai conseguir agradar a todo mundo", disse Bonassi em entrevista recente à Reuters, se referindo à obra de Drauzio Varella, Estação Carandiru, na qual o longa-metragem foi baseado. "O que eu esperava e espero é ter a emoção que o livro me deu."

Há cerca de 160 semanas na lista dos mais vendidos, o livro, lançado em 1999, vendeu aproximadamente 400 mil exemplares. Nele, o médico oncologista narra as histórias que viu e ouviu em 10 anos de trabalho de prevenção à AIDS na Casa de Detenção, em São Paulo. Babenco, seu amigo de longa data, viu o processo de criação da obra e resolveu filmá-la.

EXPERIÊNCIA PESSOAL

Escritor, dramaturgo e cineasta, Bonassi conheceu Varella antes de ser chamado por Babenco para ajudá-lo no roteiro. Ele frequentava o Carandiru para entender o espírito do lugar e fazer a concepção da montagem da peça Apocalipse 1,11, do Teatro da Vertigem, que foi encenada num presídio.

Naquela época, uma vez por semana ele ajudava os detentos a escrever cartas, histórias e poemas, além de presenciar o seu cotidiano, o trabalho de Varella, os jogos de futebol. Bonassi também tentava entender as leis que regiam o presídio.

"O Drauzio é um cara que conseguiu ficar longe da sua cria, teve muita dignidade. Não interferiu em nada no processo, nem nas questões morais", disse Bonassi.

"Tivemos que jogar muitas coisas que não eram simples penduricalhos, eram carne mesmo, faziam parte dali. Foi uma operação de corte, buscamos tudo o tinha de mais emocionante, vibrante e poético (no livro)."

Já o trabalho com Babenco foi mais complicado. "Tivemos sim uma relação conflituosa (...). Ele é uma pessoa de trato difícil, mas eu também não sou nenhum doce", afirmou Bonassi, que resolveu se "desligar" antes do final do projeto por causa dos desentendimentos quanto a crenças e valores.

"Hoje eu considero que a nossa relação foi natural, apesar de na época não achar isso", continuou ele. "Nunca tive um interlocutor tão brilhante, que tratasse com tanto tato o meu trabalho. Fora a qualidade dos nossos diálogos, que era muito boa."

Quanto às críticas negativas que o filme já vem recebendo (a última edição da revista Veja qualifica a obra como "decepcionante") Bonassi foi evasivo: "O resultado final é um pacto. O filme como ficou era uma responsabilidade básica da direção, mas a quantidade de informação é a escolha dos roteiristas."

Autor o romance Um Céu de Estrelas, que mais tarde virou o premiado longa-metragem de Tata Amaral, Bonassi terminou recentemente o roteiro de Cazuza, para a diretora Sandra Werneck. Ele tem também uma peça prestes a estrear, escrita para Raul Cortez, chamada Homo Erectus.

Reuters
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