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Premiado filme sueco, “Força Maior” questiona instabilidade da existência

4 mar 2015 - 15h32
(atualizado às 15h32)
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Um fino contraste entre controle e imprevisibilidade serve de ponto de partida para “Força Maior” (2014), filme do sueco Ruben Östlund, exibido na última edição da Mostra Internacional de São Paulo, após receber o grande prêmio da Un Certain Regard, importante seção paralela de Cannes. Uma avalanche – não tão controlada como se diz – que ocorre na história desencadeia um deslizamento metafórico, expondo um panorama de fragilidades, seja do relacionamento do casal de protagonistas ou da figura masculina culturalmente construída há milhares de anos, evidenciando, acima de tudo, o medo humano frente à ideia de heroísmo.

O filme começa justamente com o casal Tomas (Johannes Bah Kuhnke) e Ebba (Lisa Loven Kongsli), junto dos seus filhos Vera e Harry (os irmãos na vida real, Clara e Vincent Wettergren), se preparando para posar na clássica foto de família perfeita em férias. Segundo a própria esposa, o marido trabalha muito e resolveu dedicar, pelo menos, cinco dias para eles nesta viagem a uma estação de esqui nos Alpes. Um indício que, assim como o local em que estão, a relação dos dois também segue bem fria.

A aparente tranquilidade da paisagem e do relacionamento dos dois é quebrada quando, em um almoço, um barulho prenuncia a avalanche supostamente controlada que acontece na montanha atrás do restaurante a céu aberto. No entanto, o deslizamento é mais forte que o imaginado e o pânico aumenta entre os clientes. Um deles é Tomas, que antes filmava o evento e então sai correndo da mesa, com o seu iPhone e suas luvas, deixando os filhos desesperados e a mulher para trás, à mercê da neve.

Os planos fixos de Östlund e seu diretor de fotografia Fredrik Wenzel, constantes no decorrer do filme, têm o seu ápice justamente neste momento, em que a câmera parada registra toda a ação, esperando inclusive a tela ser tomada pela fumaça branca para se dissipar em seguida e revelar uma família que, apesar de estar a salvo, nunca mais será a mesma.

A crise conjugal é assim deflagrada e Ebba revela a atitude de Tomas em conversas com outros casais, enquanto o esposo não consegue admitir o que aconteceu, como se tentasse fugir do fato de não ter correspondido ao que se espera dele, seja como pai, marido, homem ou ser humano. Sem falar nas crianças, que, vendo a situação, temem a separação dos pais e têm crises de choro.

Em seu quarto longa, o cineasta sueco evoca a herança nacional de Ingmar Bergman e a influência europeia do austríaco Michael Haneke, mas imprime sua própria marca ao equilibrar a frieza no olhar sobre seus personagens, digna da paisagem alpina que lhe serve de cenário, com um caloroso humor negro. Exemplo são as contundentes DR’s da trama, ao mesmo tempo reflexivas e hilariantes, sobrando até para Mats (Kristofer Hivju, de “Game of Thrones”), amigo de longa data de Tomas, e a jovem namorada dele, Fanni (Fanni Metelius), que após ouvirem praticamente uma sessão de terapia do casal de amigos, são contagiados a se questionarem o que fariam naquela situação, quase em uma extensão do sentimento do público.

Sem querer fazer trocadilho, a obra realmente perde sua força em seu último ato, parecendo até que o diretor e roteirista desperdiça a oportunidade de encerrar bem o seu filme em determinados momentos ao insistir em sua caminhada final. No entanto, o deslize não tira o brilho de “Força Maior”, que tem a capacidade de ironizar as pressões sociais, com direito a um drone descontrolado no momento mais tenso de uma discussão, e nem por isso faz o espectador se questionar menos sobre si mesmo.

(Por Nayara Reynaud, do Cineweb)

* As opiniões expressas são responsabilidade do Cineweb

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