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'Abraços Partidos' é o filme dois em um de Pedro Almodóvar

27 out 2009 - 15h15
(atualizado às 15h26)
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Existem obras de título e existem obras de autor. Quando temos diante de nós um trabalho que se encaixa na última categoria, é da natureza do expectador criar um discurso comparativo não apenas sobre a coerência autoral, como -fato ainda mais reconfortante para nosso julgamento crítico- analisar cada novo trabalho tomando como base a tentativa de superação da assinatura (e não exatamente da obra).

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Com Pedro Almodóvar, a prática é recorrente a cada novo filme seu. Em Abraços Partidos, exibido na 33ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, não é difícil escutar "já vi melhores" depois da sessão. Tais argumentos, no entanto, negligenciam muitas vezes a obra em si, transformando a autoria em uma maldição da qual os grandes artistas, para o bem e para o mal, não podem se livrar. O que é uma pena, pois Abraços Partidos, a exemplo de tantos outros filmes almodovarianos por todos os méritos que o adjetivo neológico impõe, é um grande filme e, sem melhor ou pior anexados à expectativa da superação, é certamente uma obra-prima da dramaturgia.

Ciente de seu status, Almodóvar cada vez mais cria obras que fazem referência ao cinema e a ele mesmo, extraindo de seus elementos estéticos e narrativos o sumo de uma obra que, a despeito de comparações, sempre consegue deixar um gosto distinto (porém sempre forte) de tomate: ácido e dramaticamente vermelho. É como se o autor estivesse, em sutis intervenções na trama, afirmando estar muito confortável com suas criações, seus personagens, suas musas.

A propósito dessas últimas, Abraços Partidos desfila uma coleção de atrizes que são familiares aos admiradores do diretor. Entre elas, Blanca Portillo, Lola Dueñas, Chus Lampreave e Rossy de Palma, esta última em uma aparição de poucos segundos que condensa a essência do cômico em Almodóvar. No centro de todas essas mulheres, novamente ela, Penélope Cruz, musa do diretor em Volver (2006), retorna o papel principal deste que é um filme dois em um.

Existem duas histórias que correm em paralelo em Abraços Partidos, assim como dois tempos distintos. E a maestria do diretor está em lidar com todos esses elementos sem nunca perder a curva do fio que tece as fotos, amores e abraços partidos em um só filme.

Na primeira história, temos a narração da vida do diretor de cinema (Lluís Homar) que é visto em dois momentos: ora como Mateo Blanco, cineasta espanhol reconhecido pela crítica e apaixonado por sua nova estrela, a estreante atriz Lena (Penélope Cruz), casada com o milionário empresário Ernesto Martel (José Luis Gómez) e ora como Harry Caine, o cineasta cego e frustrado que tenta recriar novas histórias com a ajuda de sua melhor amiga, Judit (Blanca Portillo) e do filho dela (Tamar Novas). A observar que Harry Caine é um tipo de acrônimo para a palavra inglesa "hurricane", que significa furacão.

Na segunda história, o que se vê é o filme de Matteo Blanco, uma comédia com o espírito Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos (1988), do próprio Almodóvar. Nela, Lena é a personagem principal de uma narrativa que servirá como redenção final para um desfecho com algumas surpresas (para o bom conhecedor de Almodóvar, parte dessas surpresas são um tanto deduzíveis ao longo do enredo).

Tudo isso se passa em dois momentos separados por alguns anos de diferença. O fator tempo, aliás, é a prova maior de que o diretor, mais do que nunca, domina a técnica narrativa sem medo de ir e vir numa edição primorosa em cortar cenas com closes e planos abertos onde as cores quentes do cineasta sempre projetam fotografias que falam por si só. Os saltos altos, os vestidos vermelhos, a maquiagem, as cruzes, tudo tem um significado. E tudo, até o silêncio, tem o volume certo.

Tendo isso posto, Abraços Partidos é melhor e pior que outras obras igualmente magníficas de Almodóvar. Porque a grande virtude desse cineasta está em sua despreocupação em fazer de sua assinatura a sua própria narrativa.

Penélope Cruz e Lluís Homar em cena
Penélope Cruz e Lluís Homar em cena
Foto: Divulgação
Fonte: Terra
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