Orlando Margarido
Direto de Cannes
Os irmãos belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne são um caso único no Festival de Cannes, lembra a mediadora no início da entrevista com os cineastas nesta segunda-feira. Em 1999, a dupla ganhou a Palma de Ouro por Rosetta. Em 2002, nova indicação para O Filho, e uma menção especial do júri e o troféu de melhor ator para Olivier Gourmet. Três nos depois, mais uma vez o prêmio máximo do festival por A Criança.
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Agora, os Dardenne estão de volta à competição na Croisette, a badalada beira-mar onde acontece a mostra, com Le Silence de Lorna, (O Silêncio de Lorna em tradução literal). O filme, exibido pouco antes da entrevista, foi recebido com boa aceitação, mas longe de uma empolgação maior.
Quem viu algum filme da dupla sabe que seu estilo não leva a um rompante e a uma manifestação acalorada, tanto pelo rigor no jeito de filmar, como na trama sempre voltada a questões reflexivas e despida de sentimentalismo.
Seria até possível dizer que a nova fita permite algum toque sentimental na medida em que mostra a maternidade como um ponto de renovação na dura personalidade da jovem do título. Mas a estrutura do filme continua inflexível.
Para alguns críticos, esse formato começa a dar os primeiros sinais de cansaço, o que pode desviar o caminho para uma nova Palma de Ouro. Mais provável é o filme ser lembrado pela interpretação da dupla principal de atores.
Na história, a imigrante albanesa Lorna (a ótima atriz de Kosovo Arta Dobroshi, descoberta pelos diretores) conseguiu a cidadania belga ao se casar com Claudy (Jérémie Renier, de A Criança, emagrecido para o papel), um viciado em heroína.
O dilema se impõe quando Lorna quer o divórcio para viver com o namorado albanês Sokol (Alban Ukaj), também residente na Bélgica. Para tanto, Lorna precisa acelerar o processo da separação, ao mesmo tempo em que também ganhará dinheiro ao se casar com um russo, pretendente da cidadania belga. Mas Claudy pede ajuda a Lorna para superar o vício, envolvimento que vai além do esperado.
A questão da imigração e suas vítimas na Europa está sempre presente no universo dos Dardenne. Mas os diretores apontam que nesse caso, antes de tudo, a idéia inicial do roteiro foi fazer o retrato de uma jovem mulher e suas aspirações.
"Queríamos mostrar as contradições de uma jovem de sua idade, já madura mas ainda construindo sua vida e identidade num país que não é o dela", disse Luc. "Ela é dura no cotidiano, trabalhadora e decidida, mas também amorosa a ponto de ainda se dedicar a um marido de conveniência que lhe pede ajuda."
Como é habitual, os irmãos filmam com a câmera bem perto do rosto de seus personagens, quando não de costas, aproximando a lente da nuca, num procedimento que já se tornou marca exclusiva. "Dessa forma nossa intenção é valorizar, deixar bem claro o silêncio misterioso que acompanha essa jovem, que não sabemos bem o porquê", completou Jean-Pierre.
Ele ainda explicou que falar dos imigrantes é uma obrigação que se impõe da situação atual vivida não só na Bélgica como em outros países europeus e do mundo. "Acho que o cinema pode contribuir muito para se chegar a uma solução o mais fraternal possível, já que é um fato de que não se pode nem se deve fugir."
Ao explicar a inexistência de uma razão específica para escolher albaneses como os imigrantes do filme, Luc Dardenne chegou a citar o Brasil "como qualquer outro país possível de ser representado", pois "é um movimento mundial e essa escolha é apenas simbólica."
Especial para Terra
Getty Images
Jean-Pierre e Luc Dardenne promovem filme
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