61º Festival de Cannes

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Quarta, 21 de maio de 2008, 15h11 Atualizada às 15h47

Nachtergaele estréia 'A Festa da Menina Morta' em Cannes

Em um isolado povoado da Amazônia, um santo andrógino, irritadiço e milagreiro, seu pai incestuoso e mulherengo, adoradores, céticos e uma multidão de personagens fortes compõem um sólido retrato proposto em A festa da menina morta, do brasileiro Matheus Nachtergaele.

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Apresentado nesta quarta-feira na sessão oficial Un Certain Regard do Festival de Cannes, o filme de Nachtergaele leva o espectador para o alto Amazonas, às margentes do Rio Negro, uma comunidade ribeirinha.

Todos os anos, há duas décadas, a cidade recebe peregrinos que desejam obter a benção de um jovem santo andrógino. Diz a lenda que o menino, órfão de mãe, realizou um milagre ao encontrar um vestido ensangüentado de uma menina desaparecida que todos os anos fala pela boca do santo em transe.

Com a passagem do tempo, a indumentária se tornou uma espécie de relíquia, e a comemoração um negócio muito lucrativo, impulsionado pelo pai do 'menino santo', um mulherengo que mantém uma relação incestuosa com o filho. O povoado, onde vivem brancos, negros e asiáticos, é divido entre adoradores e céticos, entre eles o irmão da menina morta, amigo do santo.

Em sua estréia como diretor, o conhecido ator Matheus Nachtergaele não escolheu a facilidade para desenvolver um universo pessoal próprio, uma história complexa, sustentada por roteiro com personagens fortes, atores excelentes e direção impecável.

"O filme e os personagens são uma metáfora de uma experiência vivida por mim, não é minha história, e sim a poesia da minha história", declarou o diretor.

"Estamos perdidos sem Deus e inventamos muitas formas de fé para dar sentido a essa aventura da vida: todos os personagens de A festa acreditam em algo", disse.

"Eu quis fazer um retrato íntimo de todos os personagens que giram em torno da festa", explicou o diretor.

Nachtergaele consegue ainda incorporar com grande fluidez elementos improváveis de modernidade como canções italianas, hip hop ou um "espetáculo" de variedades patrocinado por uma marca de cerveja.

"Retrato de uma parte do Brasil, a mistura de religiões, a pobreza diante da modernidade, as pessoas que vivem longe da cidade, é uma fábula ancorada na realidade. O santinho é o centro da atenção e ao mesmo tempo é explorado pela comunidade, é líder de algo que não controla e começa a interpretar muito bem seu papel", acrescentou.

"Essa seita foi inventada por nós, com elementos do catolicismo, das igrejas evangélicas, do espiritismo e das crenças negras como o candomblé. Eu mesmo não-católico de nascimento mas nunca tive uma religião única, como boa parte dos brasileiros", explicou.

A festa da menina morta foi filmada em Barcelos, uma cidade situada a 400 km de Manaus. Para Nachtergaele, que trabalhou com Fernando Meirelles em Cidade de Deus e com Walter Salles em Central do Brasil, os dois diretores brasileiros que competem esse ano em Cannes, o fato de ser um ator se tornou uma vantagem para dirigir o filme.

"A edição e as outras etapas da pós-produção, que eu não conhecia, foram terríveis, até deixar o filme do jeito que eu havia sonhado", reconheceu.

"Em contrapartida, os atores profissionais e outros de teatro de Manaus se mesclaram muito bem com os selecionados entre a população. Eu fazia com que dançassem uma dança local, para facilitar a integração e a concentração", acrescentou.

Antes da primeira apresentação pública do filme, Nachtergaele e os 14 componentes presentes fizeram um minuto de silêncio com as mãos dadas, um ritual que realizavam todos os dias durante as filmagens.

AFP

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