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Se o cinema é um espelho do mundo, os filmes exibidos no Festival de Cannes deste ano indicam que o mundo se encontra em situação difícil. Guerra, estupros, sequestros, tortura, preconceitos, deterioração ambiental e ditaduras estiveram presentes durante os 12 dias da competição, que terminou no domingo com o diretor britânico Ken Loach recebendo a Palma de Ouro por seu drama sobre a guerra da Irlanda. Embora "The Wind That Shakes the Barley" não seja um trabalho polêmico ao estilo de "Fahrenheit 11 de Setembro", com o qual Michael Moore foi o grande vencedor de Cannes em 2004, Loach traça paralelos entre a luta irlandesa contra o domínio britânico em 1920 e os acontecimentos de hoje no Iraque. O segundo prêmio mais importante do festival foi dado a "Flandres", outro filme sobre guerra. Embora o diretor francês Bruno Dumont tenha dito que não quis transmitir nenhuma mensagem declarada, o retrato de soldados combatendo forças de língua árabe em terreno desértico fez com que as comparações com o Iraque fossem inevitáveis. O ator norte-americano George Clooney comparou esses filmes sobre temas polêmicos ao cinema político dos anos 1960 e 1970, e Loach, cineasta de esquerda que critica a invasão do Iraque em 2003, saudou o movimento. "As guerras às quais assistimos, as ocupações ¿ as pessoas não podem ignorar tudo isso", disse ele a jornalistas no domingo. "O fato de isso se refletir na telona é muito importante para a saúde do cinema. É muito instigante poder tratar disso no cinema e fazer filmes que não sejam apenas complemento para pipoca". Outros filmes de Cannes 2006 a tocar em questões delicadas foram "Summer Palace", do diretor chinês Lou Ye, cujo pano de fundo foram os protestos da Praça Tienanmen em 1989, e "Indigènes", sobre norte-africanos que combateram pela França durante a 2a Guerra Mundial. "Buenos Aires 1977" contou a história de quatro homens sequestrados e torturados pelo regime militar argentino, e "O Labirinto do Fauno" é uma fantasia sombria sobre a fuga mental empreendida por uma garota para escapar da crueldade da Espanha de Franco, em 1944. "Babel", que valeu ao mexicano Alejandro González Iñarritu o prêmio de melhor diretor, explora como os mundos ocidental e árabe muitas vezes se apressam para chegar a conclusões equivocadas um sobre o outro, devido ao clima de desconfiança reinante desde 11 de setembro de 2001. JÚRI "EXAUSTO" A jurada britânica Helen Bonham Carter disse que assistir aos filmes de Cannes foi surpreendentemente exaustivo. "Muitos dos filmes tiveram muita violência e muitas paisagens áridas. Isso nos deixou muito exauridos", disse ela. Dois dos três filmes norte-americanos que participaram da competição também se enquadraram nessa tendência. "Fast Food Nation", de Richard Linklater, é uma crítica às grandes cadeias de restaurantes norte-americanas, e "Southland Tales", de Richard Kelly, mostra o país à beira da catástrofe social e ambiental, no futuro próximo. Linklater também levou a Cannes, fora da competição, "A Scanner Darkly" (O Homem Duplo), baseado em romance homônimo de Philip K. Dick, que, segundo seu elenco, mostrou ter sido capaz de prever o futuro. Um tema importante tratado no filme é o uso que o governo faz da ameaça do "narcoterrorismo" para reprimir as liberdades pessoais. O ex-vice-presidente Al Gore apresentou um documentário sobre o aquecimento global, "An Inconvenient Truth", e dois outros diretores norte-americanos exibiram clipes de dois filmes ainda inéditos que tratam diretamente do 11 de setembro e da guerra no Iraque. "World Trade Center", de Oliver Stone, tem Nicolas Cage no papel de um policial de Nova York preso nos escombros das torres destruídas. E "Home of the Brave", de Irwin Winkler, trata não apenas da guerra, mas de seu impacto duradouro sobre os soldados que retornam a seu país.
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