Cannes 2007

Cannes 2007

Quinta, 24 de maio de 2007, 16h56  Atualizada às 17h24 Emoção e jogatina dividem a quinta-feira em Cannes

Cannes viveu nesta quinta-feira um dia de contrastes, entre a emoção provocada pelos dois belos e trágicos filmes em competição, Alexandra, de Alexandre Sokurov, e Secret Sunshine, de Lee Chang-Dong, e a estréia internacional de Treze Homens e um Novo Segredo, o último capítulo das aventuras de um grupo de trapaceiros em Las Vegas, sob a direção de Steven Soderbergh.

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O mestre russo Alexandre Surukov, autor de Tauro, Arca russa, Elegia Oriental e Uma vida humilde, nos leva com Alexandra à Chechênia, país devastado pela guerra.

Alexandra é uma anciã que vem de São Petersburgo e chega a um acampamento checheno para visitar seu neto, oficial do exército, o único familiar que lhe resta. A idosa vaga durante vários dias nesse mundo de armas e homens, mas decide ir mais além e descobre uma cidade devastada e o povo que vive lá.

A obra foi filmada na Chechênia, mas nela não há nem combates, nem bombardeios. A guerra está ali, onipresente, mas não é vista. O espectador descobre esse mundo através do olhar de Alexandra, que contempla o ir e vir dos soldados e dos tanques, e descobre a dura vida das mulheres chechenas com um terno fatalismo e uma imensa humanidade.

Muito mais do que sobre a Chechênia, Surukov fala da guerra, dos dois lados em que há seres humanos sofrendo, e deixa a porta aberta à esperança da reconciliação.

Alexandra é interpretada pela viúva do violoncelista Mstislav Rostropovich, a cantora lírica Galina Vichnevskaya que, aos 80 anos de idade, atua pela primeira vez em um filme.

Nem Vichnevskaya nem Sokuroz assistiram à apresentação do filme em Cannes. Ambos cancelaram a viagem por motivos de saúde.

Lá pelo ano 2000, o coreano Lee Chang-don surpreendeu na Quinzena de Diretores de Cannes com Pippermint Candy, um drama intenso em forma de saga protagonizada por um ex-policial. Dois anos depois, mudou de gênero e apresentou o surpreendente Oasis, uma narrativa a portas fechadas, em preto e branco, com muito amor e sexo, premiado em Veneza.

Em seguida, o coreano deixou o cinema pela política ao ser nomeado ministro de Cultura e Turismo. Secret Sunshine supõe sua volta à direção e o que menos se pode dizer é que Chang-don tenha perdido a mão.

O filme é protagonizado por uma jovem viúva que sai com seu filho pequeno de Seul, rumo à terra natal de seu marido, com a intenção de montar uma escola de piano. Secret Sunshine conta o calvário desta mulher que não consegue superar a perda de seu filho, que foi seqüestrado e morto.

Ela busca refúgio na fé e na oração, mas não pode suportar o fato do assassino de seu filho ter dito a ela que havia se tornado Deus e que a perdoava antes que ela o fizesse.

Nem mesmo a presença de um homem apaixonado e disposto a tudo por ela, o grande Song Kang-ho, que pincela com sutis traços de humor um relato trágico, consegue diminuir sua dor. O filme toca a alma dos espectadores e reforça a boa fama que os coreanos têm de serem o povo mais próximo, mais "latino" da Ásia.

Enquanto nos corredores de Cannes se elogiava a força e a beleza dos filmes da mostra competitiva, as câmeras do mundo inteiro se focavam na célebre escadaria do Palácio do Festival, escalada pelo elenco de Treze Homens e um Novo Segredo.

É verdade que sem os muito célebres atores (George Clooney, Brad Pitt, Andy García...) sem dúvida este filme réplica não teria tido cabimento na seleção do Festival de Cannes, mesmo com a maestria do diretor Steven Soderbergh, Palma de Ouro en 1989 por Sexo, mentiras e videotape e autor de filmes como Traffic e Erin Brockovich.

O terceiro filme da série iniciada com Onze Homens e um Segredo é uma jogatina cinematográfica, uma produção boa, mas sem surpresas, que faz rir com as sacadas dos diálogos, às vezes alusivas à vida pessoal dos atores. Estes se limitam a representar a eles mesmos, com a exceção de Al Pacino, que agora se une ao grupo como o vilão da vez.

Mas a receita do grande golpe organizado contra um cassino por estelionatários bonitos e simpáticos tem um gosto de prato requentado a ser servido pela terceira vez.