Veneza 2007


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Sexta, 7 de setembro de 2007, 10h36  Atualizada às 14h53

Filme de cineasta russo dá fôlego para Veneza no penúltimo dia

Orlando Margarido
Direto de Veneza
Reuters

Nikita Mikhalkov promove o filme 12 no Festival de Veneza
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12, título emblemático do filme do russo Nikita Mikhalkov, o penúltimo a ser exibido em competiçao no Festival de Veneza, é o número de protagonistas na história escrita pelo americano Reginald Rose e filmada pela primeira vez por Sidney Lumet em 1957 (Doze Homens e uma Sentença).

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O número faz relação também com o dia do mês em que se passa a reunião de doze jurados que discutem a culpa ou a inocência de um jovem que assassinou o padrasto.

Ainda pode ser interpretado simbolicamente como referência bíblica aos doze apóstolos. O cineasta, porém, preferiu ficar com a justificativa mais simples, e talvez como piada.

"Esse é o meu 12° filme", garantiu o diretor de fitas como Olhos Negros e O Sol Enganador, as mais conhecidas no Brasil. "A verdade é que haverá muitas referências a quem estiver disposto a descobri-las".

Saindo do universo da simbologia, o que conta é que o filme foi muito bem recebido pela crítica e dispara na corrida pelo Leão de Ouro num momento em que os jornalistas presentes no festival já estavam jogando a toalha.

A fita tem tanto peso, ou até mais, para disputar ombro a ombro com La Graine et le Mulet, do tunisiano radicado na França Abdellatif Kechiche. São produções que se relacionam por trazer uma visão humanista e ao mesmo tempo política e social do seu tempo.

Mikhalkov não gosta da interpretação política que pode ser dada ao seu filme. Prefere uma dimensão mais focada no caráter de seus doze homens em cena e a representação de sentimentos subjetivos como culpa e visão da liberdade.

A história tem tudo isso sim, mas será inevitável estabelecer uma ligação com a esfera política. Isso porque a trama relaciona-se com o desastrosos conflitos entre russos e chechenos, iniciados em 1994 e retomados de 1999 ate 2004.

É nesse período de guerra que um garoto checheno vê sua família ser morta e acaba adotado por um soldado que o reconhece. Anos depois, já jovem, apunhala o pai adotivo e é levado a julgamento.

Tudo isso é contado em flasback, a partir do momento em que os doze jurados são encerrados num ginásio de uma escola para debater o futuro do jovem. É essa conversa a pedra de toque do filme, não tanto pelo resultado que sairá com a decisão, mas principalmente pelas diferentes personalidades do jogo e pelos conflitos que se instalam ali.

Mikhalkov, na interpretação também de um dos jurados, consegue extrair uma acurada e poderosa visão da sociedade russa de cada um dos personagens de diferentes classes sociais, a quem é dada a palavra em monólogos que por vezes chegam a dez minutos. São grandes momentos tanto da direção, como dos atores.

Isso tem uma fatura para o público, que verá um projeto complexo, exigente na atenção e na duração de três horas.

Talvez até para equilibrar esse mergulho profundo na alma humana de Mikhalkov, a seleção tenha escalado para o mesmo dia O Caos, do veterano egípcio Youssef Chahine, último filme em concurso.

Nada melhor que este contraponto em que impera o apelo popular e melodramático típico do cineasta mais consagrado e conhecido do mundo árabe.

Chahine (A Outra, exibido no Brasil) não poupa o espectador dos ingredientes óbvios do gênero como romances, personagens bons e maus e a música para embalar tramas protagonizadas principalmente pela classe rica do Egito. Mas que costuma emendar tudo isso a um painel político de eterna confusão em seu país - ao que o título se refere - e com isso desestabilizar a opinião daqueles que enxergam em suas fitas apenas um cinema popularesco.

Não é uma evidência natural quando se tem em cena um policial corrupto, violento e grosseiro que manda torturar jovens que protestam nas ruas e ao mesmo tempo persegue uma bela professora com obsessão. Sua justificativa de amá-la a ponto de lançar mão de seu poder para tê-la tem contraponto ambíguo num jovem juiz, o galã da história, que também faz de seu cargo uma proteção quando precisa.

Mas é preciso ter paciência e força de vontade para enxergar uma visão crítica para além dos amores feitos e desfeitos dos filmes de Chahine.

Especial para Terra