Orlando Margarido
Direto de São Paulo
O Último Reduto, filme do argelino Rabah Ameur-Zaïmeche, foi elevado a uma inesperada condição de título obrigatório da 32ª Mostra graças ao francês Nicolas Klotz. Personagem central de um debate na sexta-feira, o diretor de A Questão Humana - este também uma atração obrigatória da Mostra anterior - recomendou com veemência a fita para a platéia.
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"A produção contempla personagens esquecidos, que não existem para a sociedade e consequentemente para o cinema", justificou.
É fácil entender a motivação de Klotz assistindo ao filme nesta quarta-feira no Centro Cultural São Paulo, às 18h10, e quinta, no IG Cine, às 14h. Realizador engajado e preocupado com a problemática dos marginalizados da sociedade, os párias como já os chamou literalmente em um filme anterior, Klotz viu seus anseios atendidos pelo colega em um drama direto e sem firulas.
Não que O Último Reduto precisasse de um, digamos, padrinho para ganhar prestígio, mas é natural que filmes de valor se percam no extenso calendário da Mostra. O maior mérito do drama está justamente no apelo discreto e incisivo com que trata um tema fora de moda do cinema atual.
Reflete-se aqui sobre as condições de trabalho e as primeiras reações de consciência política de um grupo de empregados explorados. Um grupo muito específico, diga-se. É formado por imigrantes africanos e árabes que trabalham numa pequena fábrica de paletas nos arredores de Paris. Mais: são muçulmanos, assim como o dono da empresa, de nome Mao, interpretado pelo diretor Ameur-Zaïmeche. Um dos trabalhadores, inclusive, está em pleno processo de conversão ao islamismo e prova sua fé aos demais num doloroso ato de auto-circuncisão que o leva ao hospital.
A primeira crise nesse território de pressão acontece quando, ao construir uma mesquita para manter os empregados dedicados ao trabalho extenuante, o proprietário indica como imã - a autoridade religiosa no Islã - seu homem de confiança e braço direito.
Mas o estopim do embate vem com o anúncio da desativação da oficina anexa para reparos de caminhões e a conseqüente demissão de dois trabalhadores. Esses e alguns aliados decidem então partir para o enfrentamento, primeiro com o anúncio de uma greve, depois com o bloqueio da fábrica - bloqueio esse feito simbolicamente com as próprias paletas que formam grandes pilhas de cor vermelha no terreno da fábrica.
A força do conflito registrado pelo diretor reside em grande parte no tom documental e de ficção que se confunde todo o tempo, como na cena inicial em que o futuro muçulmano conversa sobre sua vocação com o escolhido para ser o líder religioso. Há mesmo uma aproximação aqui com o estilo do diretor inglês Ken Loach, mas nem ele é tão veemente em seus filmes.
Ameur-Zaïmeche, que trabalhou na produção com vários integrantes de sua família, sabe do material complexo e único que tem nas mãos. Também que se trata de um tema árido e de difícil apelo às platéias atuais. Talvez por isso tenha escolhido um título igualmente pleno de significados como Dernier Maquis.
Dernier significa último. Maquis, numa acepção geográfica, designa o mato que nasce em solo degradado e formado por arbustos de difícil penetração, como o existente nas cercanias da fábrica. Desse contexto tirou-se a alcunha dos bandos de guerrilha atuantes na Resistência francesa durante a Segunda Guerra Mundial. Um jogo de palavras nada casual para um filme raro.
Especial para Terra
Divulgação
O Último Reduto, do argelino Rabah Ameur-Zaïmeche, é título obrigatório
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