Festival do Rio 2008

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Festival do Rio 2008

Terça, 30 de setembro de 2008, 11h54 Atualizada às 12h16

"Machado de Assis antecipou o cinema", afirma Júlio Bressane

Júlio Bressane é um dos mais ativos cineastas brasileiros. Com 27 longas-metragens no currículo ele já chegou a fazer dois filmes num ano, fato quase inédito no Brasil. Ao mesmo tempo, é dos mais herméticos. Um filme de Bressane quase sempre causa estranhamento no espectador acostumado à linguagem simples do cinema de Hollywood.

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É preciso muita atenção ao significado das imagens. Justamente por isso, ele costuma ser vaiado por parte do público, em festivais exigentes, ao mesmo tempo em que acaba premiado pelos jurados. Quase sempre vai muito mal de bilheteria, mas é muito elogiado por quem o assiste. No cinema de Bressane, muito aberto a improvisos, é possível até se desligar do enredo, e apreciar apenas a linguagem visual e a movimentação intuitiva da câmera.

No Festival do Rio 2008, A Erva do Rato foi calorosamente aplaudido, mas vale lembrar que a platéia era composta por muitos convidados.

Após a exibição, ele falou com exclusividade ao Terra.

O filme é passado num ambiente fechado, mas em nenhum momento é claustrofóbico, você utiliza cenas amplas, preenchendo bem todo o quadro e dando uma sensação de liberdade. Isso foi intencional?
Isso em mim é intuitivo. É difícil para mim falar de enquadramento, angulação. Eu faço a cena na hora, meu cinema é em grande parte de improviso. Essa questão da decupagem eu deixo por conta da minha intuição, da liberdade de criação.

Em relação à escolha da Alessandra Negrini, em seu filme anterior, Cleópatra, ela falava bastante. Por que você optou por ela, neste filme onde praticamente não há diálogos?
A primeira parte do filme é de linguagem verbal, enquanto a segunda usa a linguagem visual, temos um filme praticamente mudo. A Alessandra é uma grande atriz, com uma grande percepção para o personagem. Você não dirige um bom ator. Na verdade, um bom ator só faz a si próprio, ele pega o papel e faz o personagem ganhar vida. Isso é uma coisa muito difícil.

Você já tinha adaptado Machado de Assis em 1985, com o filme Brás Cubas e agora volta a Machado juntando esses dois contos num único filme. O que o atrai na obra desse escritor?
Tudo na obra do Machado me atrai. Ele é um gênio. Para quem vive e escreve na língua portuguesa, Machado de Assis é um farol, um dos pontos culminantes da língua e uma fonte inesgotável de riqueza, de recursos, de beleza verbal.

Ele é um escritor muito verbal, de elaborada construção literária, e, no entanto você fez um filme essencialmente visual, quase sem diálogos.
O Machado tem essa admirável riqueza de texto, mas também pensa muito por imagens, ele constrói muitas imagens com o texto. Em sua narrativa, há muitas imagens em movimento. Nesse sentido, Machado é um antecipador do cinema, pois faz movimentos e também montagens, sentidos simultâneos compactados, coisas que o cinema depois passou a usar.

Nesses dois contos em particular, o que o levou a transformá-los em cinema?
Duas coisas. Em primeiro lugar a dificuldade em lidar com animais, o medo dos ratos, animais pequenos. E a outra era o convívio com o esqueleto, o corpo já sem pele, sem órgãos, mas a representação da pessoa que não está mais lá. Esses dois engramas me vieram muito vivos aos olhos, depois da leitura dos contos. É uma dança de fósseis, são relações de sobrevivência. É a vida celebrada pela forma fóssil.

Redação Terra

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